Membresia

“O que exatamente estamos procurando?” Reflexões sobre a minha recente procura por uma igreja

Por Simona Gorton

Simona Gorton supervisiona os projetos internacionais do 9Marks de Seattle, Washington, onde vive com seu marido e filha. Ela tem buscado o fotojornalismo em todo o mundo para vários ministérios e é autora de uma biografia de Elaine Townsend.
Artigo
04.01.2021

Eu aprendi cedo na vida que a reputação de Cristo pode ser manchada em um só momento por causa de uma liderança humana pecaminosa. Quando eu tinha sete anos, um diácono da minha igreja cometeu adultério. Daí vieram falsas testemunhas, distorções teológicas e outros pecados cobertos pela liderança da igreja. E tudo isso se resultou num racha na igreja.

Depois de dez anos, meu pastor se converteu ao Catolicismo. Vários anos depois disso, a liderança autônoma de seu sucessor levou a igreja toda a se desintegrar.

Quando eu estava no seminário, eu encontrei uma igreja saudável e cresci ao ver cristãos imperfeitos vivendo em harmonia sob a Palavra de Deus. Pela primeira vez, eu senti como se estivesse genuinamente vendo Deus trabalhando em seu corpo aqui na Terra. Eu conheci meu marido e me casei, e então nos mudamos de novo para o estado de Washington onde eu tinha crescido – com medo de que nunca mais fosse encontrar uma igreja como aquela que nós amamos e deixamos. Nós embalamos água para o deserto proverbial.

Conforme entramos pelas portas de igrejas novas, conversamos com os crentes e nos sentamos sob a pregações de diversos mestres. Nós lutamos com a balança entre preferências e crenças, entre mediocridade bem-intencionada e fidelidade madura à Palavra de Deus. Nenhuma igreja é perfeita, então começamos a nos perguntar: O que exatamente estamos procurando?

Deus marcou o contorno de seu próprio desenho de uma igreja saudável. É o nosso dever reconhecer como uma congregação pinta as cores na prática. Se você está procurando uma igreja, eu te convido a fazer as mesmas perguntas que fizemos e a examinar alguns princípios claros das Escrituras.

A nascente do rio: o evangelho & liderança

A primeira e mais importante pergunta que fizemos pra uma igreja foi: O evangelho é comunicado claramente por líderes qualificados?

Perguntas relacionadas à essa são: O evangelho traz alegria aos pastores mesmo depois de tantos anos de ministério? O amor deles por Cristo faz com que o seu ensinamento da verdade seja tão cativante para a congregação que encoraja o cristão e atraia o incrédulo (Rm 12.1)? Eles pregam com fervor e com o desejo claro de ver os inimigos da cruz a serem transformados em filhos de Deus (Rm 10.14-15, 2 Tm 1.14, Hb 13.17)?

Os estilos musicais e o ministério infantil não são assuntos específicos da ortodoxia, mas a trajetória da igreja se evidencia na essência do louvor dominical semana após semana conforme aspectos ordinários da igreja colocam as crenças corporativas em evidência. A liderança da igreja está ativamente levantando membros da igreja para saberem as escrituras e viverem fielmente seus ensinamentos em todas as áreas da vida (Ef 4.11-15)? Esses ensinamentos estão presentes em encontros pós-culto e nas conversas entre homens e mulheres fora das quatro paredes da igreja? Falando em ensinamentos…

A Palavra entregue: pregação expositiva, teologia bíblica, sã doutrina

Investida com o poder do próprio Deus, a palavra não volta vazia. Ela convence e revela nossos mais profundos pensamentos (Is 55.11). As vezes isso é desconfortável para nós homens e mulheres caídos, mas a exposição corajosa da palavra penetrante de Deus não nos deixa na nossa fraqueza. Ao invés disso, ela nos conforta com a suficiência de Cristo.

Ouvir uma pregação destemida do evangelho nos ajuda a reconhecer o poder dos meios de graça comandados por Deus para preservar sua congregação de desvios espirituais. Antes de tudo, é isso que marca a igreja de Deus: a fiel entrega da sua palavra em sua completude (Jo 17.6-19). Quando o conselho completo de Deus é trazido para o povo de Deus, eles são sustentados em sua peregrinação para casa em glória (At 20.32, Hb 13.20-21, Jd 1.24).

Então, quando estivermos procurando por uma igreja, ao invés de super-examinarmos como ela “sente” ou simplesmente marcarmos em nossa lista, nós devemos nos questionar com as seguintes perguntas: Essa igreja nos dá os instrumentos necessários para ler a palavra de Deus por conta própria e para vivê-la fielmente nesse mundo? Nós estamos sendo consistentemente desafiados pelo nosso pecado pois está sendo iluminado pela revelação de Deus (Jr 17.9, Ef 4.11-32)? Nós estamos consistentemente sendo tirados do trono de nosso próprio coração enquanto adoramos à Deus, ou estamos adorando um deus criado por nós mesmos (Rm 1.16-32)? Nós saímos com a voz de Deus ou a voz de um homen nos nossos ouvidos (1 Pe 2.2, Hb 5.2)?

Essas questões e considerações são de última importância – questões sobre o ensino do evangelho e liderança no evangelho. Mas não é só isso…

A vida em comunidade: membresia, disciplina, discipulado, oração

Nós também queremos olhar para a vida em comunidade na igreja.

Esse grupo de cristãos leva a membresia à sério? Eles a tratam como se fosse um privilégio e responsabilidade (Ef 4.1-6)? É compreendido de forma prática que os membros da igreja são responsáveis a encorajar uns aos outros, desafiar uns aos outros e levar as cargas uns dos outros em fé (Mt 18.15-17, Ef 5, Rm 12.9-13)?

Os programas e eventos dessa igreja treinam pessoas no entendimento que todos os cristãos são responsáveis por certas pessoas e para certas pessoas? [1] Os homens e mulheres mais velhos estão procurando outros mais jovens para discipular em sabedoria e discernimento, e as gerações mais novas estão dispostas a receber esse investimento (Tt 1.3-5)? Uma ilha isolada é um lugar perigoso para se acampar.

O poder do Espírito é reconhecido através de tempos de orações intencionais (1 Co 6.11, Fp 2.1-13)? O pastor ora para que o Espírito os capacite a ministrar a Palavra e amolecer os corações dos ouvintes? As pessoas dessa igreja não somente oram, mas também ativamente incentivam uns aos outros a crescer em oração como uma prioridade e habilidade (1 Ts 5.16-18)?

Descobrir a respostas dessas perguntas provavelmente vai demorar um tempo, mas elas são vitais. Mas ainda tem mais…

Por fora da bolha: evangelismo, conversões, missões

Nós também queremos saber como a igreja cuida do mundo que as observa.

Esse grupo de cristãos se vêem como representantes do Reino em um mundo perdido, e eles agem para trazer inimigos do evangelho para comunhão como pecadores redimidos (Mt 5.13-16)? Eles acolhem incrédulos, apresentam os argumentos de Cristo em amor, e imploram sinceramente para que eles abandonem seus próprios esforços de justiça (Rm 8.6, Ef 2.1-10, Cl 2.13)? Eles ministram para a comunidade local, e além da comunidade local para a região, e além da região para outras culturas e nações onde a Palavra de Deus não é proclamada e a igreja não está estabelecida (Mt 28.18-20)?

O próprio evangelho vai causar escândalo, mas é a nossa responsabilidade assegurar que nosso comportamento como cristãos não crie barreiras adicionais para a fé de nossos amigos incrédulos (1 Co 8.9-13, 9.19-23, At 16.3, 21.17-26). Um líder de um ministério de plantação de igrejas disse assim: “A igreja saudável entende sua missão e propósito no mundo e organiza sua vida e trabalho para ser fiel e efetiva no seu dado contexto.”

A adoração e entendimento do evangelho na igreja faz com que aumente o calor e a energia de seus membros como embaixadores do evangelho da paz (2 Co 5.11-15)? Se não, o domínio teológico só serviu pra cultivar orgulho intelectual (1 Co 4.1-7, Rm 11.18).

A igreja é chamada para ser única na cultura ao seu redor pois se deleita no evangelho e atinge o mundo ao seu redor com tal amor que faz as reivindicações do evangelho soarem verdadeiras.

Uma coisa peço

Eu e meu marido colocamos raízes em uma igreja local aqui em Washington onde a palavra é proclamada com coragem, onde outros cristãos lutam por santidade e buscam comunhão significativa. Nós estudamos o livro de Jonas juntos, oramos com um ex-presidiário depois da rejeição de sua esposa, e desenvolvemos relacionamentos com um empadão de frango e conversas nas noites chuvosas de terça-feira.

Nós agradecemos muito que nossa procura por uma igreja acabou. E também agradecemos por ter encontrado água no meio do deserto.

Ao longo do caminho, nós somos continuamente relembrados que fazer parte de uma igreja não é primariamente uma questão de “se encaixar”, mas, como Davi escreveu tão explicitamente sobre estar na casa do Senhor:

“Uma coisa peço ao Senhor,
e a buscarei:
que eu possa morar na Casa do Senhor
todos os dias da minha vida,
para contemplar a beleza do Senhor
e meditar no seu templo.”

—Salmos 27.4


[1] Take Your Church’s Pulse, Koster and Wagenveld, 2014

 

Tradução: Beca Bruder.
Revisão: Filipe Castelo Branco.

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