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Quando igrejas definham, o nome de Deus é zombado

Por Bobby Jamieson

Bobby Jamieson é doutorando em Novo Testamento na Universidade de Cambridge. Anteriormente, ele trabalhava como editor assistente do Ministério 9Marks, nos EUA.
Notícias do 9Marks
16.03.2017

Por quase toda parte dos Estados Unidos (e algumas outras partes do mundo), algumas igrejas evangélicas quase literalmente poluem a paisagem.

Muitas dessas igrejas são como lixo deixado nas esquinas – elas fazem com que as pessoas atravessem a rua para evitá-las. As pessoas que pertencem a essas igrejas professam crer no evangelho, e suas declarações históricas de fé confessam o evangelho. E, de fato, alguns cristãos verdadeiros pertencem a tais igrejas. Mas, no geral, a vida da igreja difunde qualquer outra coisa, exceto a mensagem do evangelho. Essas igrejas emitem lixo tóxico, em vez do alimento nutritivo de que o povo necessita.

Algumas igrejas nesse estado podem ser irrecuperáveis. Mas o fato triste é: muitos evangélicos parecem satisfeitos em ignorar tais igrejas e simplesmente começar outras novas.

Plantar igrejas é importante e estratégico, e eu me alegro em ver mais e mais pessoas engajadas nessa obra.

Mas, se você visse um jardim coberto de ervas daninhas, simplesmente plantaria alguns belos lírios bem no meio dele? Se você não pudesse ouvir o noticiário da TV porque seu rádio estava alto demais, simplesmente aumentaria ainda mais o volume da TV?

Eu sugiro que a revitalização de igrejas – o trabalho de trazer vida a igrejas moribundas, ao lidar com as causas de seu declínio e edificá-las na fidelidade – é uma responsabilidade bíblica. Quero dizer, quando vemos essas igrejas agindo como antitestemunhas de Cristo, nós deveríamos, conforme a Escritura, tomar o encargo de fazer algo acerca disso. O propósito deste artigo é provar tal ponto.

Revitalização de Igrejas: Uma Prioridade Apostólica

Considere a carte de 1Coríntios. Paulo plantou a igreja em Corinto por volta de 50 d.C., e ele escreveu essa carta apenas alguns poucos anos depois, em resposta a relatos que ouvira acerca da igreja, assim como a algumas questões que a igreja lhe apresentara. Quais eram os problemas que levaram Paulo a escrever? Considere os seguintes:

  • Divisões e facções: alguns diziam “Eu sigo Paulo” ou “Eu sigo Apolo” (1.10-17);
  • Tolerância à imoralidade sexual (5.1-13);
  • Demandas judiciais entre membros da igreja (6.1-8);
  • Confusão acerca do casamento e da sexualidade (7.1-40);
  • Divisão na igreja quanto aos limites da liberdade cristã (8.1-13; 10.1-33);
  • Disputas acerca da adoração (caps. 11-14);
  • E falsos ensinos acerca da ressurreição (cap. 15).

Se você olhar de soslaio e puser de lado as particularidades culturais, a igreja em Corinto, por volta de 55 d.C., é a imagem escarrada de muitas igrejas evangélicas hoje. Muitas igrejas hoje estão envoltas em uma parecida e potente mistura de falsos ensinos, imoralidade, divisão, contendas e mundanismo de toda sorte. Muitas igrejas hoje estão em semelhante necessidade de uma cirurgia pastoral radical, que possa salvar suas vidas e restaurar sua saúde.

Então, ao se deparar com esses problemas em Corinto, o que Paulo fez? Ele não disse: “Essas pessoas não têm esperança. Elas são uma mistura de falsos crentes e pessoas orgulhosas, teimosas e religiosas. Você não quer aquelas pessoas na sua igreja, de modo nenhum” – e então enviou Timóteo a ir e plantar uma nova igreja em Corinto.

Em vez disso, ele lidou com eles. Ele veio vê-los de novo e de novo. Ele os repreendeu e os instruiu e os suportou. Resumindo, ele trabalhou para reformar a igreja de Deus que estava em Corinto.

Sim, há descontinuidades entre a situação de Paulo e a nossa. Para citar apenas um exemplo, essa igreja era a única igreja em Corinto naquela época. Mas o ponto ainda permanece: em vez de deixar a igreja de Corinto simplesmente apodrecer em seu pecado, Paulo labutou para recuperá-la e restaurá-la. Um tipo semelhante de recuperação e restauração é exatamente o de que inúmeras igrejas evangélicas necessitam hoje.

E isso é consistente com as prioridades mais amplas de Paulo como um apóstolo. Diferentemente de alguns missionários contemporâneos, Paulo não tentava simplesmente começar o maior número de igrejas no menor tempo possível. Em vez disso, eis o que Paulo fez após a sua primeira viagem missionária: “Alguns dias depois, disse Paulo a Barnabé: Voltemos, agora, para visitar os irmãos por todas as cidades nas quais anunciamos a palavra do Senhor, para ver como passam” (At 15.36). E assim Paulo “passou pela Síria e Cilícia, confirmando as igrejas” (At 15.41).

Paulo estava tão preocupado com a saúde das igrejas as quais havia plantado que, apesar das imensas regiões do Mediterrâneo ainda por evangelizar, e de sua ambição de fazê-lo pessoalmente (Rm 15.20), ele voltou a uma região em que já havia labutado, a fim de fortalecer as igrejas. Eu sugiro que, se havemos de seguir os passos de Paulo, como a Escritura nos chama a fazer (1Co 4.17; 11.1; Fp 3.17), então devemos ter uma responsabilidade pela contínua saúde e firmeza das congregações que carregam o nome de “cristãs” e professam aderir ao evangelho.

Igrejas não são biodegradáveis. E, quando elas começam a desintegrar, podem exalar por anos, décadas ou até séculos um mau cheiro que ofusque o aroma de Cristo. Quando uma igreja é dividida, ela proclama que Cristo está dividido (1Co 1.13). Quando uma igreja tolera imoralidade, ela diz ao mundo que Cristo não é santo – e que os sexualmente imorais, os idólatras, os bêbados e os roubadores irão herdar o reino de Deus (veja 1Co 6.9-11).

Então nós, como Paulo, deveríamos ter uma responsabilidade pela restauração, revitalização e reforma de igrejas que estejam em vários estágios de enfermidade. E nós temos não poucas dessas igrejas em nossas mãos, especialmente nos Estados Unidos.

Jesus, o Reformador de Igrejas

Nas cartas às sete igrejas de Apocalipse 2 e 3, o próprio Jesus trabalha para reformar aquelas congregações locais. Ele fala àquelas igrejas com o fim de consertar o que está quebrado, curar o que está enfermo, reprovar o que é falso, e dar nova vida ao que está morrendo.

Eis aqui uma amostra: Jesus reprova os efésios que eram doutrinariamente saudáveis, mas careciam de amor (Ap 2.2-7). Ele recomenda a igreja em Pérgamo por conservar o seu nome, contudo a reprova por acolher falso ensino e a chama ao arrependimento (Ap 2.13-17). Na igreja em Tiatira havia alguns que mantinham falso ensino, e Jesus promete julgá-los (Ap 2.20-23), mas recomenda o resto da igreja e os encoraja a perserverar (Ap 2.19, 24-28). E à igreja em Sardes Jesus diz:

Conheço as tuas obras, que tens nome de que vives e estás morto. Sê vigilante e consolida o resto que estava para morrer, porque não tenho achado íntegras as tuas obras na presença do meu Deus. Lembra-te, pois, do que tens recebido e ouvido […] Tens, contudo, em Sardes, umas poucas pessoas que não contaminaram as suas vestiduras e andarão de branco junto comigo, pois são dignas (Ap 3.1-4).

Se você precisa de um versículo que sirva de texto-prova em favor da revitalização de igrejas, Apocalipse 3.2 o é: “Consolida o resto que estava para morrer”.

É verdade que esse versículo foi escrito à própria igreja, mas não deveriam igrejas irmãs e aspirantes ao pastorado exemplificar a compaixão de Cristo para com igrejas como aquela em Sardes? Não deveríamos nós ter uma preocupação com o remanescente fiel em tais igrejas, que sofrem nas mãos de falsos mestres?

Jesus reformou e revitalizou igrejas – sete delas apenas nesses dois capítulos. Nós deveríamos fazer o mesmo.

O Povo de Deus Carrega o Nome de Deus

Uma outra motivação que a Escritura nos dá para a reforma e revitalização de igrejas é que o povo de Deus carrega o nome de Deus. Os cristãos são batizados no nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo (Mt 28.19). Os cristãos são o templo dos últimos dias, a corporificação do lugar onde Deus fizera seu nome habitar (1Rs 8.17, 19). A igreja é o povo que foi chamado pelo nome do Senhor, os quais ele criou para a sua glória, os quais ele formou e fez (Is 43.7).

Além disso, Deus é zeloso pela glória do seu nome (Is 48.9-11) – e nós deveríamos sê-lo também.

Mas, como dissemos, quando igrejas definham no pecado, na divisão e no nominalismo, o nome de Deus vira zombaria na praça. Tais igrejas difamam o nome de Deus, em vez de adorná-lo e magnificá-lo.

Uma igreja decadente e mergulhada no pecado é como um farol com a lâmpada e o refletor quebrados. Em vez de refletir a luz da glória de Deus milhas a frente, de chamar pecadores ao porto seguro da misericórdia de Deus, uma igreja assim deixa a noite tão negra quanto estava antes – ou até mais. É como uma estação de rádio cujo sinal foi sequestrado: não importa o que ela confesse crer, tal igreja difunde mentiras sobre Deus, em vez da verdade.

Assim, uma preocupação com o nome de Deus, o qual ele pôs sobre o seu povo – e sobre as suas assembleias corporativas em um sentido especial (Mt 18.20) – deveria nos impulsionar à reforma e revitalização de igrejas. Como Mark Dever tantas vezes disse, revitalizar igrejas é como um pague-um-leve-dois pelo reino. Você derruba uma má testemunha e ergue uma boa testemunha em seu lugar.

E Daí?

Se esta é uma defesa bíblica consistente, o que deveríamos fazer? Eu diria simplesmente que, à medida que nós pensamos em como propagar o evangelho e testemunhar para o reino, a revitalização de igrejas deveria ser uma importante opção a considerar. Deveria ser algo em que nossas igrejas pensassem, planejassem e pelo que orassem. Igrejas que desejem propagar e promover o evangelho devem estar preocupadas, assim como Jesus e Paulo, em fortalecer e restaurar o testemunho de igrejas com problemas.

Considere refletir sobre o que a sua igreja local pode fazer para ajudar outras igrejas locais que estejam com problemas. Conheça-as. Descubra as necessidades delas. Construa relacionamentos com elas. Esteja aberto a ajudá-las de todas as formas que puder, incluindo, se a oportunidade surgir, enviar um pastor e pessoas para ajudarem na obra de reforma.

Se você aspira ser um plantador de igreja, considere a revitalização de igrejas como uma alternativa além da plantação. Se você revitalizar uma igreja, pode estar glorificando a Deus e servindo o seu povo não apenas por estabelecer uma nova igreja (o que é essencialmente o que reformar uma igreja muitas vezes significa), mas também por limpar a sujeira que seus irmãos e irmãs deixaram pela cidade. Assim como nós limpamos fisicamente a nossa vizinhança, você pode ficar surpreso em como nossos vizinhos apreciam uma igreja espiritualmente renovada. E quem sabe quantas igrejas podem ser plantadas ou revitalizadas a partir da sua renovada congregação!

A revitalização de igrejas deveria ser nossa paixão porque é a paixão de Deus, como visto no ministério pessoal do Senhor Jesus Cristo exaltado, e do apóstolo Paulo. O povo de Deus carrega o nome de Deus, então nós também deveríamos nos esforçar para fortalecer “o resto que está para morrer”.

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